13, não, 14 livros sobre o Terramoto de Lisboa
(actualizado a 4-11-2024)
Foi no dia 1 de Novembro de 1755. A terra revoltou-se e todos pensaram que era Deus que se revoltava. Lisboa foi arrasada e, graças a este acontecimento, é hoje uma cidade-mistério. Uma cidade em que caminhamos e olhamos o que hoje existe ao mesmo tempo que imaginamos o que já não existe. Caminhamos sobre uma cidade que foi e já não é, mas ainda é.
Juntei nesta lista alguns dos livros que nos levam para esse dia e para os que se seguiram. Com estes livros, vamos caminhar sobre escombros.
Alguns de ficção:
A história de um brasileiro que chega a Lisboa com uma missão importante tem como pano de fundo a Lisboa que se transforma. O terramoto não teve só efeitos no plano físico da cidade. Neste romance, Miguel Real mostra o cataclismo social, político e religioso em que a Voz do Céu (do poder temporal, da Igreja) é calada para que se oiça a Voz da Terra (do poder secular, do Marquês de Pombal). É engraçado… Quando via este título, pensava que a voz da terra era o ruído que a terra fez ao tremer…
Peça de teatro que retrata também esta passagem da Lisboa medieval à Lisboa iluminista, desta vez acompanhando um caso de incesto. Li há muito tempo que Miguel Real, sempre que escreve uma ficção sobre determinado tema ou período, aproveita a pesquisa feita para escrever também um ensaio. Ou seria o contrário? Qualquer das duas me parece interessante e me faz querer ler a ficção e o ensaio. Julgo que o ensaio que este livro, de teatro, e o anterior, de ficção, A Voz da Terra, originaram, foi O Marquês de Pombal e a Cultura Portuguesa (Quid Novi, 2006).
E se Casanova viesse a Lisboa a seguir ao terramoto? Nestas cartas imaginadas, Mega Ferreira apresenta-nos uma Lisboa que, ao mesmo tempo que receia Deus, quer viver como se não houvesse amanhã – como aconteceu a quem não sobreviveu, e não aconteceu, mas podia ter acontecido, a quem sobreviveu. Sempre com um olhar irónico de um estrangeiro com muita vida vivida.
Escrevi sobre este livro aqui.
Uma menina escocesa vem parar a Lisboa e dá-se o terramoto! A menina é muda e tem um super-poder: vê a morte. Nesta história, cruza-se com duas mulheres apaixonantes, uma verídica e a outra ficcional: Leonor de Almeida, a Marquesa de Alorna, e Blimunda Sete Luas.
Escrevi sobre este livro aqui.
História ficcionada do arquitecto da reconstrução de Lisboa, Eugénio dos Santos e Carvalho, e de como dos escombros fez nascer uma cidade recticulada, ordenada e racional, à imagem das novas ideias iluministas – que despontaram muito em consequência do terramoto.
Tinha-me esquecido deste e – ui, o que foi de mensagens a lembrar-me! Agradeço a todos e todas. Neste livro, o autor apresenta-nos um conjunto bem diverso de personagens, minutos antes do terramoto – onde estavam e o que cada uma uma delas estava a fazer. Logo se dá o terramoto, e vemos a forma como cada uma é afectada pela catástrofe e imaginamos o que será esta experiência inimaginável.
Incluindo um infanto-juvenil:
E se dois miúdos em 1998 se metessem numa máquina do tempo e fossem parar a 1755, a Lisboa dias antes do terramoto? E se nesses dias fizessem amizades e amores e tivessem de regressar a 1998 sem os avisar da catástrofe?
Li este livro há muito tempo, porque queria que os meus filhos o lessem, e surpreendi-me com tanto que aprendi sobre o Marquês de Pombal mas também sobre Ratton e outros industriais das fábricas do Rato e das Amoreiras, sobre o ladrão do Aqueduto das Águas Livres, sobre o Padre Malagrida…
E alguns de não-ficção:
Rui Tavares é um historiador que nos põe a pensar. Neste pequeno livro, explica-nos em pormenor, recorrendo a relatos da época, o que se passou naquele fatídico dia, e debate os efeitos da catástrofe – daquela e de outras – nas mentalidades. O mundo pula e avança, não só quando um homem sonha: também, sobretudo, quando é forçado a pôr tudo em causa.
Tem como sub-título Apocalipse na Idade da Ciência e da Razão. Este é um grande ensaio sobre o impacto que a catástrofe que se abateu sobre Lisboa teve no pensamento ocidental.
John Michel é filho do iluminismo: para ele os desastres não resultam da vontade divina mas sim de causas naturais que importa estudar para poder prevenir. Descobriu que os terramotos partem de um epicentro e avançam por ondas sísmicas. Neste documento, explica tudo isto e calcula o ponto exacto do epicentro do Terramoto de Lisboa de 1755.
Voltaire reflecte em verso sobre as causas do terramoto. Recusando as explicações religiosas em favor das científicas, recusa a possibilidade de redenção do homem, que o protegeria da fúria divina. Aceitando as causas naturais, dava à humanidade uma dimensão nova, que a punha à mercê da aleatoriedade da natureza.
Na mesma linha do livro anterior, mas aqui em forma narrativa – chama-se-lhe um conto filosófico. O jovem Cândido é educado por Pangloss nas teses do optimismo de Leibniz (tudo acontece pelo melhor, ou como Deus quer), que aqui são alvo do sarcasmo e crítica de Voltaire. Perante a catástrofe de Lisboa, Cândido enfrenta um terramoto intelectual que o faz questionar aqueles ensinamentos.
O Terramoto de Lisboa teve uma repercussão imensa no pensamento filosófico europeu, que tinha já uma estrada percorrida no racionalismo de Descartes e nas teorias de Galileu, Newton, Kepler… Nestes escritos, Kant procura explicar os terramotos por via das causas naturais e não sobrenaturais.
Incluindo este que nos fala em directo:
Como uma reportagem em directo, estas cartas fazem o relato semanal ao Papa do que se passava em Lisboa na sequência do terramoto. Valioso!
Lista não exaustiva, claro. Quais deles já leu? Deixe um comentário com as suas impressões.
Margarida Branco
© Ler por aí… (2024)
O Domingos Amaral também escreveu dois volumes sobre o tema!
Quando Lisboa tremeu
Como é que me esqueci do Domingos Amaral? Tem toda a razão, Filipa, obrigada! Vou ter mesmo de acrescentar. Embora, claro, a lista não seja exaustiva, Quando Lisboa Tremeu tem que entrar – e passa a 14 livros!