Ler por aí… em Berlim, na Alemanha
“A Tia Sophie é aquela figura esquelética de faces cavadas, vestida com uma camisa de hospital cheia de nódoas, que, com os seus olhos avermelhados semicerrados, me olha fixamente da sua cama de hospital, como se eu fosse uma alucinação. Tem um cachecol de lã escarlate enrolado à volta do pescoço e a minúscula mão direita enterrada dentro de uma luva preta gigantesca que mantém em concha sobre o colo, com a palma de couro virada para cima; parece um enxerto da mão de um gorila.
Embora Sophie vá passar a semana inteira à procura da outra luva por entre as almofadas e os lençóis, e embora vá insistir comigo para que exija a sua devolução a todas as enfermeiras do piso, ela vai continuar perdida para sempre no meio da folhagem que cobre os terrenos à volta do Hospital da Universidade.”
A Sétima Porta
A promessa de regressar a este livro foi feita em Outubro de 2007. Dez anos depois (dez anos?!) visitei Berlim. Aqui estou, hoje, a terminar este texto sobre A Sétima Porta. Depois de o ler. Depois de o Ler por aí… – este livro acompanhou-me antes, durante e depois de Berlim. São 650 páginas de Berlim, de Sophie, de Isaac, de Hansi, de Vera…
A Prenzlauer Alle, onde ficava a casa da Sophie, e também a do Isaac, acompanha uma linha de metro de superfície. O mapa de Berlim na época, que é facultado no início do livro – obrigada, Richard – mostra que a casa da Sophie ficava na esquina com a Marienburger Straße, onde agora temos uma papelaria. O bairro Prenzlauer Berg é hoje uma zona animada, com bares, restaurantes e lojas de espírito multicultural e alternativo, na antiga Berlim Oriental (no tempo de Sophie não havia essa divisão entre Berlim Ocidental e Berlim Oriental). Se atravessarmos a Prenzlauer Alle, a Marienburger Straße continua na Wörther Straße, que desemboca na Kollwitzplatz. Esta praça é o epicentro da animação deste bairro. Olhando para o mapa da época, porém, parece que nesta praça estaria localizado um cemitério judeu. Do outro lado da praça, passa a Schönhauser Allee, onde fica uma antiga fábrica de cerveja, hoje transformada em espaço cultural e de lazer. Seria esta fábrica a responsável pelo eterno cheiro a lúpulo e a malte que Sophie reconhece no seu bairro de Berlim?
O livro vai abrindo sete portas, que nos são apresentadas através dos manuscritos de Berequias Zarco, já nosso conhecido do século 16: foi ele O Último Cabalista de Lisboa.
Isaac é descentende de Berequias, e estuda os manuscritos. A narrativa avança, uma porta de cada vez. Uma porta de cada vez, a Alemanha avança numa loucura que sabemos onde termina. Sentimo-nos impotentes. “À entrada da Sétima Porta, a vossa história pára de ser contada e ouvida, embora cada palavra esteja destinada a renascer.”
Richard Zimler
Richard Zimler nasceu em Nova Iorque em 1956. Vive em Portugal desde 1990
O Último Cabalista de Lisboa é o seu primeiro romance. Seguiram-se Trevas de Luz, Meia-Noite ou o Princípio do Mundo, Goa ou o Guardião da Aurora, À Procura de Sana, A Sétima Porta, Confundir a Cidade com o Mar (contos), Os Anagramas de Varsóvia, Ilha Teresa, A Sentinela, O Evangelho Segundo Lázaro, e Os Dez Espelhos de Benjamin Zarco. Escreveu também livros infantis: Dança Quando Chegares ao fim, Hugo e Eu e as Mangas de Marte, Se Eu Fosse, O Cão Que Comia a Chuva, Maria e Danilo e o Mágico Perdido.
Em 2009, Zimler escreveu o guião para o filme de Solveig Nordlund, O Espelho Lento, uma curta-metragem baseada num dos seus contos. O filme venceu o prémio de melhor filme dramático no Festival de Curtas-Metragens de Nova Iorque em Maio de 2010.
Já proferiu mais de 500 conferências sobre a sua escrita e a cultura judaica, em escolas, museus, bibliotecas, livrarias, sinagogas e auditórios públicos em mais do que 15 países.
Berlim, Alemanha
Berlim é a segunda cidade mais populosa da Europa, a seguir a Londres. Ali vivem pessoas de cerca de 180 nacionalidades.
Sem querer apagar o passado, é uma cidade virada para o futuro. Nas ruas, restam ainda alguns vestígios da cidade anterior aos bombardeamentos. A diferença entre a Berlim Ocidental e a Berlim Oriental é visível. Nesta surgiu, nos últimos anos, uma vaga de cultura alternativa.
Quanto ao muro, está bem assinalado. Onde subsiste, está coberto de interessantes grafitti.
Visite o Checkpoint Charlie. Visite também o Museu dos Judeus, cuja história tem início em 1933, tendo sido encerrado no terceiro Reich e re-aberto em 2001 com uma arquitectura muito arrojada, e onde se pode conhecer a história de dois mil anos dos judeus em Berlim e na Alemanha.
Margarida Branco
© Ler por aí… (2019)
Boa tarde,este livro fez parte de uma visita a Berlim em Maio deste ano ,de um grupo de leitores do qual faço parte.Por motivos pessoais não pude acompanhar o grupo.Li o livro e nessa viagem um outro serviu de mote “Morrer em Berlim”de Hans Fallada .Este último ainda não tive oportunidade de o ler mas quase todos os participantes acharam excelente
Olá Madalena, então o vosso grupo de leitores andou a Ler por aí… Podemos saber de que grupo se trata? Se puder enviar links do Facebook ou Instagram ficamos em contacto.
Não conhecia o livro de Hans Fallada, boa sugestão!